Para que fique bem claro: Mary Shelley nunca escreveu uma
sequela a Frankenstein. Como tal, o curto prólogo deste Bride Of Frankenstein,
que consiste num diálogo fictício entre a autora, o marido e o amigo Lord Byron,
ambos poetas ingleses de relevo no séc. IXX, tem o sabor amargo de uma
justificação mal-amanhada do mítico produtor Carl Laemmle Jr. e da sua direção
nos estúdios da Universal para a tentativa de espremer ao máximo a história do
médico que gera vida num corpo feito de partes de cadáveres e garantir um novo
sucesso de bilheteiras. Nada que seja invulgar nos dias de hoje, na realidade…
A isto segue-se um regresso ao moinho destruído pelo fogo
que dita a morte do monstro no final de Frankenstein. Ou assim parecia.
Enquanto vamos sendo novamente apresentados a personagens como o presidente da
câmara, o pai da menina Maria ou Elizabeth – todas representadas por atores
diferentes, daí a necessidade de se gastar tempo a vincar quem é quem –
percebemos que Karloff está bem de saúde, tem a franja melhor arranjada e vai
continuar a aterrorizar a região. Por outro lado, o amigo e o barão foram
esquecidos e a casa de família ganhou, inexplicavelmente, uma governanta
insuportável.
Henry Frankenstein (ainda Colin Clive), que viramos a ser
atirado do topo do moinho no primeiro filme, é declarado morto e depois vivo em
segundos, como se ele próprio renasce-se. Sem quaisquer mazelas físicas, o que
é mais impressionante. Ou ilógico, depende da perspectiva. Como já não há doutor
Waldman, outro professor da universidade vem bater-lhe à porta, um menos cético
e íntegro que o anterior, o doutor Pretorius, que tem conduzido as suas
experiências paralelas com a existência humana. A sua base teórica é mais
biológica e menos tecnológica, tendo cultivado pessoas em miniatura, que guarda
e jarros de vidro.
É uma ideia bizarra, que o argumento não consegue explicar
para além de que terá sido desenvolvida uma espécie de semente. Por ironia, o
método de Pretorius tem aspeto de ser mais eficaz do que a engenharia
eletrotécnica de Frankenstein, o único problema, como o próprio admite, é o
tamanho dos espécimes. Por razões que não se compreendem, nada disso volta a
ser mencionado e este concorrente tenta convencer o novo barão a prosseguir o
seu já conhecido trabalho. Elizabeth vai ter de esperar outra vez, é o que faz
melhor, tirando berrar de medo.
O monstro não se limita a vaguear pelas montanhas. Aprende a
falar, a beber, a fumar, faz um amigo e acaba por obedecer a Pretorius,
ajudando à pressão que se abate sobre Henry para voltar a assumir o papel de
criador, desta vez de uma mulher. Fica estabelecido que é possível reverter-lhe
o comportamento homicida através da compreensão e quando alguém tolera a sua
companhia (simbolicamente, um cego) os notórios laivos de moderação constituem
uma variação bem-vinda. No entanto, nunca desenvolve uma consciência moral; dou
como exemplo a vontade em ter a noiva que lhe prometem.
Digo isto porque se realmente estivesse a germinar nele um pingo
de humanidade, não estaria motivado em fazer alguém passar pelo que tem
passado. Mesmo que domado, fica a ideia de que permanecerá animalesco, o que,
em certa instância, tornaria irrelevante qualquer tentativa de integração. Quando
Tod Browning prosseguiu de Dracula para Freaks, foi no sentido de convidar o
público a ver além do exterior e além da estereotipagem. James Whale preferiu
reavivar a clivagem entre deuses e monstros, arrastando-se, com uma história
menor, por um universo literário que já havia esgotado quatro anos antes.
Nos últimos minutos, para os quais estão reservadas duas
reviravoltas que impedem o filme de ser um desperdício (para além da fotografia
de John J. Mescall), Karloff irrita-se e destrói tudo e todos que o rodeiem,
exceto o casal Frankenstein; Henry deu-lhe vida e agora mantém a sua. Não é
misericórdia, é um reconhecimento, um aviso e uma chapada de luva branca desintencional. A
noiva, a única alma penada à face da terra com a mesma origem, rejeita-o. O tesão
transforma-se em raiva. Impiedosas ironias. Infelizmente, por essa altura já desfilou
um sem número de convenções narrativas vetustas que em nada engrandecem o
monstro ou acrescentam aos temas.
3/10