Quando Winston Churchill declara
que um certo filme fez mais pelo esforço da Inglaterra na Segunda Guerra
Mundial do que uma esquadrilha de navios, não há muito a acrescentar. Estou a
falar de Mrs. Miniver, um melodrama sobre uma família burguesa que vive
pacificamente nos arredores de Londres e é indelevelmente afectada pelo
conflito. Como diz o padre da paróquia local, entretanto destruída por ataques
aéreos, mas cheia como sempre, o povo foi chamado a participar, por força das
circunstâncias, pela dimensão da destruição e pela ameaça do totalitarismo
nazi, e não está no seu carácter fraquejar nestes momentos.
Apesar de a produção ser
americana (os mais atentos repararão nos bamboleantes sotaques), aquilo a que
se convencionou apelidar de qualidade britânica faz algum sentido aqui: a contenção
sólida a todos os níveis e a atenção ao detalhe, sem grandes inovações e
simplesmente funcional, dão ao filme o charme que um melodrama sofisticado
requer. Começa suavemente, com episódios da vida privilegiada que Vic, o filho
mais velho dos Minivers e aluno de Oxford, critica por serem prova da
perpetuação do regime feudal, sempre com as mesmas famílias no topo e na base
da pirâmide.
Ironicamente, quem lhe chama a atenção
para a sua inacção para ajudar os menos desafogados e afortunados é Carol
Beldon, a herdeira da referência aristocrática do burgo. Vic apaixona-se por
ela, e ainda bem, pois é uma vantagem ter ao nosso lado alguém que nunca se
coíbe de dizer a verdade. Aos poucos, a sombra da guerra substitui as compras
na baixa, os bailes informais e os concursos de flores e, talvez por querer fazer
algo pelo bem comum mas também proteger o que conquistou a nível pessoal, Vic
alista-se na Royal Air Force. Ao mesmo tempo, o pai é um dos muitos civis
convocados a participar na batalha de Dunkirk.
A importância histórica do filme
advém da assumida intenção de Wyler em envolver os EUA na guerra, por acreditar
que a luta do Reino Unido era valorosa mas a força nazi tinha de ser combatida
com mais aliados. As motivações alemãs e a perigosidade dos seus ideais são
vincadas pela raiva, talvez exagerada, talvez não, dum piloto perdido e a monte
que entra na casa dos Minivers; é um momento tensíssimo a vários níveis. Efectivamente,
a simpatia dos americanos por esta causa aumentou e o próprio realizador
voluntariou-se para o exército a seguir, estando ao serviço quando ganhou o
Óscar da categoria (o primeiro de três).
É interessante verificar a
evolução do cinema em menos de uma década. Cavalcade tinha sido eleito o melhor
do ano pela Academia em 1934 - ainda muito influenciado pelo teatro e com uma
fotografia deficitária, essa saga familiar britânica está a milhas desta
posterior, a nível técnico (o selo de qualidade William Wyler não falha) e de
representação (Greer Garson e Teresa Wright em especial têm cenas conjuntas
exigentes, que lidam com uma classe à parte). Os créditos finais aparecem, mas
o maior conflito armado de sempre estava ainda longe de terminar…
8/10
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