Jacques Tourneur senta-se mais
uma vez na cadeira de realizador num projecto de Val Lewton e o resultado é um
sucesso, no mínimo ao nível de I Walked With A Zombie, certamente maior que The
Leopard Man. Em comum, este segundo tem com Cat People também uma ameaça
felina, como os títulos fazem questão de revelar. Porém, a incerteza sobre a
possibilidade de uma (ou mais) pantera(s) se soltar(em) que toma conta de Cat
People adiciona-lhe uma camada de ocultismo que a simples espera pela próxima
vítima por esgravatamento não pode dar a The Leopard Man.
Irena (Simone Simon) não é só uma
imigrante sérvia bonitinha por quem Oliver (Kent Smith) é seduzido e amestrado facilmente,
descende dum grupo de bruxas que escaparam à morte escondendo-se numas montanhas
e desenvolvendo poderes de transfiguração. Pelo menos é nisto que ela acredita
e, no mundo civilizado, este poder torna-se numa maldição. Basicamente,
qualquer demonstração de afecto ou estímulo sensual podem acordar estes ímpetos
e transformá-la numa gata gigante e perigosa, literalmente, o que vai tornar a
atracção mútua entre a designer e o engenheiro complicada.
A história desenvolve-se
pacientemente, com a devida decadência de um casamento sem interacção física. O
espectador é recompensado com nuances de repressão sexual feminina. Este
fenómeno sociológico roça a patologia, é-lhe imposto desde sempre pelo medo e
quando o medo se instala a repressão torna-se automática, é feita pelo
indivíduo. Irena não quer sequer beijar o marido, por achar que algo mau pode
acontecer, e este aceita tais condicionalismos em nome de um sentimento que vem
a descobrir ser só fascínio e não paixão.
Duas cenas destacam-se neste
mundo de sombras: a da piscina, em que a colega e segunda namorada de Oliver no
filme nada sozinha, no escuro, com laivos de luz a reflectir a ondulação da
água nas paredes e a serem ocasionalmente entrecortados pela silhueta de uma
pantera, talvez real, talvez simbólica da aproximação de Irena, e a do
escritório à noite, onde a iluminação é outra vez maravilhosa. Quando o terror
era mais do que o susto fácil, a nudez gratuita ou a mediocridade narrativa,
eram possíveis obras com mérito artístico e orçamento reduzido como Cat People.
8/10
Acho que o realizador fez muito com pouco (orçamento) realmente :)
ResponderEliminare o remake é completamente diferente.
Eu adoro estas produções da RKO, é mesmo fazer muito com pouco.
EliminarO remake tenho de ver. Imagino que seja muito mais óbvio. Tenho curiosidade, porque o Schrader é melhor realizador do que lhe dão crédito, mas quando se fica com o rótulo de argumentista não há nada a fazer :P