“Behind every code is an enigma”
diz o poster original deste The Imitation Game, resumindo brilhantemente, numa
frase, as duplicidades do filme e espicaçando a curiosidade. A nível de enigmas
temos a máquina de criptografia com esse nome usada pelos nazis durante a 2ª
Guerra Mundial para transmitir mensagens por rádio sem que os aliados
conseguissem decifrar e a personalidade idiossincrática do matemático Alan
Turing, que seria o primeiro a deslindar o seu funcionamento. Os códigos são a
parte mais visível desse trabalho, mas também os eufemismos, os disfemismos, as
regras de etiqueta e outras figuras de estilo e padrões de comportamento que
usamos todos os dias para obter o que queremos, mascarar o que dizemos ou
guardar segredos, consoante a necessidade. Quanto ao “behind”, pode ser uma
referência tanto ao esforço de guerra feito longe das linhas da frente como à
homossexualidade da personagem principal. Ok, agora levei estes “double
entendres” demasiado longe.
Vou deixar as piadas de lado, porque
este drama histórico é bastante deprimente. Os horrores dos combates, dos
campos de concentração e da devastação causada nas cidades de meia Europa,
habitualmente o foco das revisitações deste período, são quase um rumor, no
entanto a tensão vivida no departamento de criptografia dos serviços de
inteligência britânicos, mascarado em Bletchley como uma fábrica durante muito
tempo, e os fragmentos de eventos anteriores e posteriores, relativos às
tristes experiências pessoais do incompreendido Turing, que apenas contribuíram
para o tornar cada vez mais arrogante, anti-social e tergiversante, são
suficientes para criar uma atmosfera tão cinzenta quanto a meteorologia local.
Desde o início, quando ele é entrevistado pelo comandante Denniston para
integrar a equipa encarregue de estudar a Enigma, fica claro que quem o rodeia
tipicamente prefere julgá-lo, insultá-lo e até bater-lhe a fazer um esforço
para o ajudar. Turing é sistematicamente subestimado por ser diferente.
As suas ideias encurtariam a
guerra em cerca de dois anos, estima-se, porém tiveram de se manter em segredo
de estado por várias décadas, outro factor que adiou uma análise justa do
alcance da sua genialidade. Apenas podemos imaginar que mais inovações teria
desenvolvido caso não se tivesse suicidado em 1954. Com a reputação manchada e
a saúde comprometida depois de ter sido condenado por indecência, já que a
homossexualidade era ilegal, forçado a submeter-se a um processo de castração
química, o professor terá desistido de aturar os seus demónios. A estrutura do
argumento é impecável na forma como concilia esse período final e a infância,
marcada por bullying e uma decepção amorosa trágica, com o dia-a-dia atribulado
em Bletchley, dando outra profundidade aos tiques, às hesitações e à fisionomia
única que Benedict Cumberbatch empresta ao papel. Comparando com outra
biografia de um cientista inglês deste ano, The Theory Of Everything, não tenho
dúvidas de qual é o melhor filme e de qual contém a melhor interpretação.
8/10
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