Chegamos àquela altura do ano.
Não, não é o Carnaval, ainda que também esteja já aí à porta, mas por acaso
estava a pensar nos Óscares. Na sua 86ª edição, os prémios da Academy of Motion
Picture Arts and Sciences (AMPAS) estão mais do que estabelecidos como os mais
vistos, os mais desejados, os mais concorridos, os mais glamorosos, os mais
comentados do cinema… e os mais criticados. Que se tornaram na referência pela
qual o sucesso (ou, pelo menos, a popularidade) de um filme é medido não dá
para contornar, especialmente no ramo dos actores, que levam a sério mais do
que ninguém a atenção prestada aos seus esforços sobretudo individuais (um
quarto dos votantes são actores). Academy Award Winner ou Nominee passa quase a
constar do bilhete de identidade, precedendo o nome em apresentações, trailers
ou posters. A fama e as ofertas são atractivas, mas os Óscares, pela sua
longevidade, representam um lugar garantido no panteão da sétima arte. Saber
que o Titanic podia bater o recorde de onze vitórias em 1998 de Ben-Hur fez 57
milhões de pessoas sentarem-se no sofá. A vontade de ver uma jovem tornar-se a
segunda mais nova de sempre a ganhar Melhor Actriz fez de Jennifer Lawrence
must-see TV em 2013. Isto tem tudo mais importância porque a história já pesa
em cima desta cerimónia e, num meio onde o valor é subjectivo, as comparações
são a melhor avaliação.
Contudo, por cada onda de
entusiasmo e expectativa parece haver outra de detracção, e as razões costumam
ser variadas. Os apresentadores tipicamente dividem opiniões. O espectáculo é
longo demais. Os nomeados deixam candidatos amados pela opinião pública ou pela
crítica de fora. Os vencedores são amiúde aborrecidos ou demeritórios.
Sinceramente, assumo-me como fã dos Óscares, seguidor de todo o buzz que os
rodeia e faço a directa da praxe quando chega Fevereiro/Março para acompanhar a
emissão, mas dou todos esses argumentos de barato… excepto o último. Nem toda a
gente precisa de dar o mesmo peso a esta tradição, nem toda a gente precisa de
se deixar contagiar pelo escape que proporcionam, qual extensão da própria
irrealidade do cinema, agora, apresentar como argumento contra uma suposta
falta de credibilidade nas votações não é realista. A AMPAS conta neste momento
com 6000 membros, com conhecimento vasto e de todos os cantos do planeta.
Que sistema pode ser melhor do
que o voto democrático de uma população tão grande? Certamente não é o dos
Globos de Ouro, que são decididos por 90 jornalistas estrangeiros que só têm de
viver na Califórnia e publicar, no mínimo, quatro artigos anuais, podendo passar
o resto do tempo na praia. Gosto muito dos festivais e sigo com atenção o que é
apresentado em Cannes, Berlim ou Veneza, mas a universalidade dos filmes que
por lá passam é relativa, afinal são selecionados por comités anónimos e
premiados por um júri rotativo e exíguo. É verdade que há lobbys em Hollywood,
se não fosse a insistência de Harvey Weinstein, com campanhas agressivas de
publicidade e festas de arromba, em 1999 Shakespeare In Love talvez nunca
tivesse sido Melhor Filme – talvez. Comprar tantos votos não é assim tão
linear, e até nesse caso houve outros factores contra os (agora) melhor
recordados Saving Private Ryan e The Thin Red Line, como a falta de burburinho
típica quanto a filmes de guerra e o lançamento do vencedor em Janeiro e não no
Verão. Michael Haneke é um crítico violento e consistente da indústria
americana, mas foi reconhecido pelo seu mérito artístico em 2013. Dizer que os
Óscares têm perdido o seu relevo porque o filme preferido da Maria Josefina não
ganhou no ano passado nem o Citizen Kane quando ninguém estava preparado para o
seu impacto é redutor. A maioria de um grupo enorme escolheu outro. Não é
difícil de aceitar. Se isso não for consolo suficiente, no mínimo just sit back
and enjoy the ride – ver alguém ser reconhecido pelo seu trabalho com ouro, admirar
a namorada nova do George Clooney e ouvir umas piadas não é assim tão mau.
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