Logo à cabeça, duas grandes
razões para ver este filme de terror: Clive Barker e Bernard Rose. Candyman
parte de uma ideia original do primeiro, um dos maiores escritores vivos do
fantástico, que também passou com sucesso para o cinema com Hellraiser, e foi
realizado pelo segundo, o mentor do criminosamente subestimado Paperhouse.
Quando os créditos iniciais começam a rolar e, de fundo, ouvimos a mais
assustadora trilha de Philip Glass, dominada pelo órgão, e imagens de Chicago
vista de cima, numa espécie de distorção da abertura de West Side Story,
passando-se logo a seguir para um zoom in numa colmeia com a voz distorcida da
entidade do título a falar em derramar sangue, fica-se logo com pele de galinha
e colado à cadeira.
Helen Lyle está a elaborar a sua
tese, sobre mitos urbanos. Fascinada com a história de Candyman, um espírito
assassino que aparece com um gancho afiado no lugar duma mão, investiga, sem
zelo, a sua ligação ao problemático bairro Cabrini-Green, um projecto de
habitação enorme. Apesar do cenário citadino intimidante, a história remonta ao
tempo da escravatura, dando ao filme um óbvio subtexto de perpetuação do racismo
na América. Helen vive num prédio de luxo mas feito com a mesma planta,
contacta com uma mulher da sua idade que é mãe solteira, num jogo de espelhos a
nível do argumento, e, no fundo, temos um afro-americano demoníaco a perseguir uma
branca estudiosa.
Com vários mal-entendidos e
encontros sobrenaturais à mistura, a violência começa a suceder-se e, ao fim de
meia hora, o rumo passa a ser completamente imprevisível, bem como o
comportamento de Helen, que primeiro é espancada, depois é acusada de matar um
bebé e ainda sofre outros reveses a nível pessoal. Como se já não bastasse ser
das mulheres mais bonitas a aparecer no cinema, Virginia Madsen dá uma das
melhores interpretações de sempre. De sempre. A sua personagem leva tanta
porrada, física e psicológica, e a actriz passa por tantos estados de humor com
uma credibilidade tal que não me resta alternativa senão fazer esta afirmação. O
strip forçado na esquadra da polícia é brutal, porque o procedimento assim o
exige, mas está no ar um tom de condenação e humilhação pesadíssimo.
A figura de Anthony Todd como
Candyman é intimidante e seria difícil imaginar outro actor no papel, até porque
as sequelas solidificaram essa imagem de um gigante com olhar ameaçador. Há
alguns piscar de olhos a Hitchcock: o tema das falsas acusações, o crescendo de
tensão com reviravoltas inesperadas e até a protagonista loira. Rose consegue
também ser extremamente criativo com a selecção dos planos e dar ao filme um
tom cruel quando necessário, para além do ambiente de terror urbano. Se, depois
de Psycho, entrar no chuveiro nunca mais é a mesma coisa, depois de Candyman
olhar para o espelho também deixa de ser tão inócuo quanto isso.
8/10
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