Ao longo da minha vida já vi
muitos filmes estranhos. La Planète Sauvage é um dos que mais sobressai e tem,
no mínimo, lugar garantido no pódio. Só para dar uma ideia do que estou a
falar, isto começa com uma mulher em trajes do paleolítico a correr desalmadamente
com um bebé entre os braços por uma floresta espinhosa, até que chega a uma
colina e uma mão azul gigante lhe dá um sopapo e ela cai. A cena repete-se, de
seguida pedras esponjosas rodeiam-na, setas caem à sua volta, e acaba por ser
agarrada, elevada a uma altura considerável e largada, estatelando-se no chão.
De uma distância maior, verificamos que foram três crianças alienígenas com
aspecto aquático (apesar de não se ver uma gota de água em lado nenhum),
barbatanas no lugar das orelhas e 20 metros de altura que a mataram, deixando o
filho humano (aqui denominados Oms) órfão.
O jovem Tiwa adopta-o, como
alguém escolheria uma formiga para animal de estimação, pois no planeta dos
Traags somos considerados uma espécie sem inteligência e que se multiplica
rapidamente. A animação de La Planète Sauvage, produzido na Checoslováquia, um
país onde o talento para o género ainda não ocupa o lugar devido na História do
cinema, é tão psicadélica como a banda sonora roqueira de Alain Goraguer. Paisagens
ermas e pejadas de plantas invulgares são o habitat natural de uma civilização
intelectualmente avançada, mas dominada pelos dogmas da Meditação.
Apesar das dificuldades em se perpetuarem,
acham-se superiores e nada querem aprender com os humanos, chegando a ser
desconfortável a forma como os subjugam, claramente subestimando-os. Quando o
bebé, entretanto baptizado de Terr, se torna adulto, foge com uns phones que
educam os Traggs jovens, gravando conhecimento directamente no cérebro, e
encontra um grupo de dissidentes que habita num parque. Por uma vez, os humanos
são os ameaçados e têm de encontrar uma forma de ganhar o seu espaço e
direitos, nem que tal signifique uma guerra com aparente disparidade de recursos.
Pelo meio de tanto sci-fi surrealista está essa premissa continuamente actual
de luta contra os preconceitos e a marginalização. A originalidade de La
Planète Sauvage é inegável, e, mesmo nem sempre me sentir captivado por um
estilo tão bizarro a todos os níveis, a criatividade do realizador não deixa de
surpreender.
7/10
Dos filmes da minha vida!
ResponderEliminarCumprimentos cinéfilos,
António Tavares de Figueiredo