Explicar a crise financeira de 2008 não é tarefa fácil,
mesmo que se recorra a milhentas analogias para resumir a essência dos
conceitos inventados pelos grandes bancos para mascarar a insustentabilidade de
assumir um crescimento infinito da economia. O documentário Inside Job continua
a ser o guia mais compreensivo desta trapalhada em que se transformou o sistema
financeiro global, para além da frontalidade com que acusa entrevistados
comprometidos com a desregulação e a imoralidade que a originou, em nome de
todos os inocentes que foram afetados pela crise.
De certa forma, Hollywood está a aproveitar-se da
evidenciação dos podres de Wall Street para reformular tramas antigamente
associadas aos gangsters. Os mafiosos foram substituídos pelos banqueiros,
basta reparar como Martin Scorsese, que percebe uma ou duas coisas sobre a
matéria, avançou para um conto de ascensão e queda, à maneira de Goodfellas ou
Casino, com a ironia afiada como nunca, em The Wolf Of Wall Street. Para a
maioria, a perceção destes crimes bateu à porta com a força de uma bomba no
seguimento da falência da firma Lehman Brothers. Para uma reduzida minoria, não
foi surpresa.
Em The Big Short, andamos atrás de alguns iluminados. Ryan Gosling
é Jared Vennett (Greg Lippmann na realidade), um corretor do Deutsche Bank que ganhou
milhões a apostar contra os empréstimos hipotecários de alto risco que
mantinham o imobiliário seguro dissimuladamente. Steve Carell é Mark Baum
(Steve Eisman na realidade), um gestor de contas que usa o dinheiro dos
clientes com o mesmo intuito. Brad Pitt é Ben Rickert (Ben Hockett na
realidade), informante que gosta de se autoproclamar como reformado. Christian
Bale é Michael Burry (Michael Burry na realidade), um gestor que é o primeiro a
investir desta forma.
Desde o início que somos advertidos para a falta de
escrúpulos quando se trata de ganhar dinheiro na alta finança. Burry é um
semi-autista que arrisca o que tem baseado num palpite repentino mal explicado.
Ben tenta incutir ética em dois jovens que ajuda a navegar pelo meio para
juntos serem cinicamente recompensados pela audácia de remarem contra a superioridade
americana. Baum é o único que tem um episódio pessoal capaz de o transformar em
mais do que um desinteressante especulador. O seu estilo confrontador tem
raízes que são exploradas e sente com agudeza o dilema de lucrar com a desgraça
alheia.
A maioria das personagens tem pouca profundidade e
justificam a sua existência com um destilar de dados sem fim. Adam McKay rasga
o escasso material dramático em pedaços para o misturar com citações vagas ou despropositadas
explicações “meta” dadas por Selena Gomez num casino ou Margot Robbie na
banheira. The Big Short é um trabalho de colagem virulento e terrivelmente
montado. Sem novidades, prova, contudo, a podridão de Wall Street e a falta de
proteção que o americano comum tem, inclusive a nível político, no qual se
devia zelar pela regulação e fiscalização de todas as atividades da sociedade.
5/10
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