quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Saw (James Wan, 2004)

Depois de uma década demarcada por um aumento da explicitação da violência no ecrã e pela especialização no género de vários realizadores americanos e europeus, os thrillers aparecem nos anos 90 com nova bagagem. Filmes como The Silence Of The Lambs ou Seven tomam o cinema de assalto, caracterizados por grande carga psicológica e sentido estético, impondo-se como arquétipos nos tempos vindouros. Ainda hoje vemos uma constante sucessão de cópias dos trabalhos de Jonathan Demme ou David Fincher, que, com maior ou menor sucesso artístico, maior ou menor sucesso financeiro, continuam, no mínimo, a ser consideradas modernas.

Saw insere-se neste panorama a uma infinidade de níveis. Jigsaw, um serial killer com muito tempo nas suas mãos, constrói puzzles macabros que deixam a polícia perplexa e se destinam a ensinar as suas vítimas a apreciar a vida. O filme escolhe não explorar a personagem do assassino e focar-se nos outros 2 tipos de intervenientes, começando com um fotógrafo e um médico a acordar presos com correntes pelo tornozelo numa casa de banho decadente sem saber como lá chegaram ou o que estão lá a fazer. Através duma enormidade de flashbacks, a história vai-se adensando e vão aparecendo respostas pertinentes, ainda que nem sempre lógicas.

Há, aliás, muito pouco que faça sentido no argumento deste filme, o que fere constantemente a sua credibilidade, desde os frágeis motivos que explicam o ethos de Jigsaw, passando pela conduta dos seus mais recentes prisioneiros, Adam e Lawrence, até pormenores irrealistas como um civil ser autorizado a assistir a um interrogatório policial, quase como se o horror e a criatividade dos actos de tortura operados nas cenas mais intensas pudessem por si só ser suficientes para o salvar, saciado que estará o eventual desejo sórdido de sangue do espectador. A violência não aparece num contexto, o contexto é criado artificialmente para tentar justificar a violência.

Não se pode negar que há mão firme na realização, ainda que James Wan não consiga oferecer um cunho verdadeiramente pessoal ao visual visceral e de um realismo austero de Seven. Copia o processo bleach bypass de revelação da película, ou seja, dispensando parcial ou totalmente o banho branqueador para aumentar a saturação da imagem, e vai longe demais com a montagem ultra-vitaminada, mas consegue criar um ambiente claustrofóbico eficaz. Já os actores, deixam muito a desejar, com reacções exageradas mas sem força por todo o lado. Tobin Bell tem muito pouco que fazer no papel de Jigsaw e a justificação para isso é talvez a menor de todas as razões pelas quais o final é frustrante.

O papel central acaba por ser mesmo das armadilhas, afinal é apenas disso que toda a gente fica a falar, de como este ou aquele se lixa e com o quê. O filme exige constantemente uma reacção e é difícil não nos rendermos, nem que seja já quase a acabar, quando Lawrence atinge uma catarse e toma medidas extremas para escapar ao cativeiro e à morte, porque consegue ser muito intenso, ainda que nem sempre de forma equilibrada, mas a sua terrível construção destrói-o e torna a violência apenas exploratória, parece um guarda-redes a tentar fintar sem sucesso um ponta-de-lança e a sofrer um golo como consequência. Pelos vistos, há quem aplauda isso.

3/10

5 comentários:

  1. Completamente de acordo com a crítica, talvez subisse a nota para um 5/10 eheh. Mas esta é uma saga que me diz pouco.

    Cumps

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  2. Assisti todos os filmes da série e reconheço que as sequências são mais do mesmo, apesar de divertirem os fãs do gênero.

    Quanto ao original, considero um bom filme, deixando os exageros de lado, o clima angustiante criado pelo diretor prende a atenção.

    Abraço

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  3. Sim, há algum bom suspense e ambiente, fica-se por aí :P

    Cumprimentos!

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  4. O primeiro filme desta mais que explorada saga é brilhante! O resto não vi e, provavelmente, nunca virei mas, certamente, ficarei sempre com memórias deste Saw.

    Abraço
    Frank and Hall's Stuff

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  5. Aleluia que há mais alguém no mundo que não gostou do Saw. Sempre que digo isso recebo sempre olhares desconfiados e expressões do tipo "És maluco pá, isso é o melhor filme de suspense de sempre!!!" Duvido que tenha estado nos 1000 melhores do ano em que saiu ;)

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