domingo, 23 de agosto de 2015

Adventureland (Greg Mottola, 2009)

Depois de ter realizado um argumento de um dos mais conhecidos atores cómicos americanos da atualidade (Seth Rogen) em 2007 com Superbad, uma genial comédia de situação, Greg Mottola volta agora com um filme totalmente da sua autoria, mais indie e nostálgico, passado nos anos 80, sobre os amores e desamores de Verão de adolescentes empregados num parque temático cheio de personagens sui generis.

Com laivos de Sofia Coppola, mas sem o sexto sentido estético desta, Adventureland consegue, ainda assim, captar um ambiente muito próprio, num período muito específico, com charme e graça, equilibrando bem as gargalhadas e as lágrimas, em parte devido: 1) à abordagem relaxada e honesta aos pequenos dilemas e devaneios próprios da idade, desde o tabu da virgindade à convivência com as drogas e o álcool; 2) à escolha acertada dos atores principais, Kristen Stewart (Em), Jesse Eisenberg (James) e Martin Starr (Joel), cada um com abordagens diferentes à sua arte e à sua personagem.

Os momentos mais desvairados são quase exclusivamente assegurados por um conhecido de infância de James e os dois dementes responsáveis pelo parque (Bill Hader e Kristen Wiig), mas os maiores interesses de Mottola são mesmo a intimidade que se vai criando dentro e fora da Adventureland entre James e Em, ambos a tentar amealhar dinheiro suficiente para poderem financiar os seus primeiros anos em universidades de Nova Iorque, onde começarão as aulas em breve, e os erros que cometem, na sua imaturidade.

O filme adquire uma dimensão dolente quando nos é dado a ver o ambiente familiar de Em, cujo pai viúvo se deixou sacar por uma mulher vil e déspota, razão pela qual a miúda tenta passar o máximo de tempo possível fora de casa. Apesar dos sentimentos que os unem, ela não se compromete com James, e mantém, às escondidas, uma relação com um homem casado (Ryan Reynolds), mecânico no parque. Em é mais frágil do quer dar a parecer, mas a forma como arrasta este assunto muito depois de beijar James e de perceber que pode ter uma relação estável com ele parece exagerada.

Não ajuda que Ryan Reynolds seja um dos mais insípidos atores que andam por aí e em cada cena que aparece o filme perde o rumo. Mas para um filme que navega algures entre American Pie (Paul Weitz, 1999) e All The Real Girls (David Gordon Green, 2003), entre o humor, por vezes cáustico, e as extravagâncias do primeiro e a naturalidade e delicadeza do segundo, podia ser bem pior.

7/10

sábado, 15 de agosto de 2015

Friday the 13th (Sean S. Cunningham, 1980)

Há superstições para tudo. Algumas têm a sua origem em crenças antigas, amiúde infundadas, que se transmitiram de geração em geração sem que alguém saiba bem porquê, lembro-me dos pés de coelho. Outras parecem mais medidas de segurança, passar por baixo de uma escada pode não ser uma boa ideia, corre-se o risco de levar na cabeça com alguém com pouca noção de equilíbrio. Cruzar caminho com um gato preto faz sentido, ou qualquer gato, já que estou nesta temática, porque toda a gente sabe que são criaturas traiçoeiras, enviadas para a Terra pelo Diabo. Mas e os espelhos? Bater na madeira? Ou, mais desconcertante, o medo de que o calendário e a matemática estejam a conspirar em conjunto para nos prejudicar num dia tão específico e aleatório como as sextas-feiras treze?

Claro que tudo isto é terreno fértil para o cinema de terror. Depois do sucesso de Halloween em 1978, os assassinos em série ganharam o seu próprio subgénero, os filmes slasher, e multiplicaram-se ao longo dos anos 80. Este Friday The 13th foi uma das primeiras tentativas de replicar a fórmula. O dinheiro choveu de todos os lados, as sequelas não demoraram muito a aparecer, e, mais tarde, os remakes. Que grandes atributos lhe podemos atribuir? Um ambiente de cortar à faca? Uma narrativa aliciante? Inovações tecnológicas? Um psicopata memorável? A respota é “nope” a tudo, pelo menos neste primeiro tomo. Aquela lentidão e estranheza ubíqua que se entranham quando se vê o filme de John Carpenter não encontram rival aqui, o cenário do lago idílico é muito mais suspeito em Let’s Scare Jessica To Death, a originalidade da história de A Nightmare On Elm Street está a milhas, não se pode esperar grandes planos num low budget destes e o mítico Jason Voorhees marca presença num total de 0,0035 segundos e com um aspeto muito diferente do brutamontes com máscara de ski a que estamos habituados.

Portanto, uma desilusão a vários níveis. Trinta e tal anos antes, o Camp Crystal Lake era um paraíso para os pais que gostam de se livrar das crianças e adolescentes quando entram de férias no Verão. Isto até ao ano em que dois monitores foram assassinados perante freeze frames patéticos e o tempo passa até algum iluminado se lembrar de desafiar o destino e o reabrir. Logo na primeira noite, enquanto os novos monitores ainda estão a conhecer os cantos à casa e aos corpos uns dos outros, alguém os persegue, como que por vingança. Claro que com tantas hormonas à solta e sangue a espirrar, Friday The 13th cativou audiências mais jovens. A traqueia do Kevin Bacon é trespassada com uma seta, o que é espetacular. Nada contra o Kevin Bacon. Já agora, como é que o Kevin Bacon atende uma chamada? A dizer “tou-cin-ho?”.

4/10

sábado, 1 de agosto de 2015

Mission: Impossible - Rogue Nation (Christopher McQuarrie, 2015)

O realismo nunca foi a maior preocupação no universo Mission: Impossible, nem na série original, nem na sua tradução cinemática, como os planos elaborados, as máscaras de látex, as one-liners ou a presença dos Limp Bizkit na banda-sonora sempre fizeram questão de sublinhar, o que não quer dizer que não há um nível de discrição mínimo que seja exigível, para nos fazer crer que, com mais ou menos explosões, talvez até fosse possível existir uma agência de espionagem especializada em situações de alta complexidade e que estivesse constantemente a correr o risco de ser exposta, como a Impossible Missions Force, ou IMF.

Claro que tal aura se torna difícil de manter quando, ao quarto filme, o Kremlin é obliterado, o Burj Khalifa é escalado e a Transamerica Pyramid é trespassada por uma bomba nuclear, colocando Ethan Hunt (Tom Cruise) no patamar de alguns super-heróis da Marvel e DC Comics no que diz respeito à destruição de edifícios icónicos. Este franchise tenta equilibrar alguma extravagância com alguma sobriedade e, sob esta perspectiva, o primeiro filme tem-se mantido inigualado, ao qual a única crítica que se pode fazer é a falta de consideração pela personagem principal na televisão, Jim Phelps, que se revela um traidor.

Rogue Nation percebe os fatores que tem de balançar. O argumento não cai no erro de tornar a história demasiado pessoal, como aconteceu em 2000 e 2006, encontrando novos elementos que a engrandecem. Como se sabe, a cena em que o líder da equipa recebe uma gravação que descreve a missão e acaba com “esta mensagem vai-se autodestruir em cinco segundos” é obrigatória e raramente adulterada. Essa regra é quebrada aqui, tal é a influência do Sindicato, uma organização composta por antigos agentes secretos de várias nacionalidades, como Solomon Lane (um Sean Harris sibilino).

A escala absurda de Ghost Protocol é mesmo realçada pelo diretor da CIA Alan Hunley (Alec Baldwin) para suportar a ideia de que não faz sentido manter uma unidade tão rebelde como a IMF, o que manda Ethan Hunt para a clandestinidade à procura de criminosos que podem não passar de um rumor. O seu chefe William Brandt (Jeremy Renner) chega a duvidar da sanidade do agente, assim como o espectador, o que é um elemento interessante de ver, porque éramos sempre levados a desprezar o aparente acaso dos métodos de Hunt. O carisma de Tom Cruise e de Simon Pegg (estilos completamente diferentes) vem ao de cima.

A atriz Rebecca Ferguson agarrou o melhor papel da sua carreira até agora e também o melhor papel feminino dos filmes feitos até agora. Não é estritamente colega, como Emmanuelle Béart e Paula Patton foram, nem “damzel in distress”, como Thandie Newton e Michelle Monaghan foram, é uma espia com lealdade questionável, objetivos em conflito com os da IMF, fria e bem treinada. Robert Elswit na fotografia é outro destaque. A forma como a cena na ópera de Viena se desenrola é de pura mestria visual, em especial nos ângulos utilizados. Rogue Nation sobe assim automaticamente para segundo no ranking Mission: Impossible.

8/10