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domingo, 23 de agosto de 2015

Adventureland (Greg Mottola, 2009)

Depois de ter realizado um argumento de um dos mais conhecidos atores cómicos americanos da atualidade (Seth Rogen) em 2007 com Superbad, uma genial comédia de situação, Greg Mottola volta agora com um filme totalmente da sua autoria, mais indie e nostálgico, passado nos anos 80, sobre os amores e desamores de Verão de adolescentes empregados num parque temático cheio de personagens sui generis.

Com laivos de Sofia Coppola, mas sem o sexto sentido estético desta, Adventureland consegue, ainda assim, captar um ambiente muito próprio, num período muito específico, com charme e graça, equilibrando bem as gargalhadas e as lágrimas, em parte devido: 1) à abordagem relaxada e honesta aos pequenos dilemas e devaneios próprios da idade, desde o tabu da virgindade à convivência com as drogas e o álcool; 2) à escolha acertada dos atores principais, Kristen Stewart (Em), Jesse Eisenberg (James) e Martin Starr (Joel), cada um com abordagens diferentes à sua arte e à sua personagem.

Os momentos mais desvairados são quase exclusivamente assegurados por um conhecido de infância de James e os dois dementes responsáveis pelo parque (Bill Hader e Kristen Wiig), mas os maiores interesses de Mottola são mesmo a intimidade que se vai criando dentro e fora da Adventureland entre James e Em, ambos a tentar amealhar dinheiro suficiente para poderem financiar os seus primeiros anos em universidades de Nova Iorque, onde começarão as aulas em breve, e os erros que cometem, na sua imaturidade.

O filme adquire uma dimensão dolente quando nos é dado a ver o ambiente familiar de Em, cujo pai viúvo se deixou sacar por uma mulher vil e déspota, razão pela qual a miúda tenta passar o máximo de tempo possível fora de casa. Apesar dos sentimentos que os unem, ela não se compromete com James, e mantém, às escondidas, uma relação com um homem casado (Ryan Reynolds), mecânico no parque. Em é mais frágil do quer dar a parecer, mas a forma como arrasta este assunto muito depois de beijar James e de perceber que pode ter uma relação estável com ele parece exagerada.

Não ajuda que Ryan Reynolds seja um dos mais insípidos atores que andam por aí e em cada cena que aparece o filme perde o rumo. Mas para um filme que navega algures entre American Pie (Paul Weitz, 1999) e All The Real Girls (David Gordon Green, 2003), entre o humor, por vezes cáustico, e as extravagâncias do primeiro e a naturalidade e delicadeza do segundo, podia ser bem pior.

7/10

sábado, 6 de dezembro de 2014

Hadewijch (Bruno Dumont, 2009)

Qualquer interpretação deste filme tem de começar… pelo fim. Céline (Julie Sokolowski) tenta matar-se em duas ocasiões e não é claro se sai com vida de ambas, o que também não ajuda a posicioná-las cronologicamente. A linearidade da história é questionável nos últimos 20 minutos, mas se assumirmos que realmente Hadewijch acaba com um flashback podemos ter aqui um exercício de imaginação do futuro de Mouchette enquanto jovem adulta, caso ela tivesse nascido nos anos 90 e alguém a tivesse tirado do lago a tempo. Dumont inverte o contexto familiar da personagem (o pai não é um alcoólico pobre, antes um ministro pusilânime) e insiste numa problemática religiosa que a criança de Bresson não tinha mas poderia vir a ter.

Se foi possível o título Rebel Without A Cause metamorfosear-se em Fúria de Viver no português, talvez se pudesse traduzir Hadewijch para Fúria de Amar. É a confusão de sentimentos e de sinais que causam essa irritação e os leva a fazer as perguntas e a tomar os caminhos errados. Céline tem apenas certeza de que não encontrará o amor que deseja em prazeres carnais (se continuarmos com a analogia a Mouchette é possível especular que foi vítima de pecados mundanos, o que lhe atribui um determinado nível de perdão católico, cuja manifestação procura). Assim, apenas Jesus a pode preencher e ela pergunta-lhe “porque me obrigas a perseguir-Te incessantemente? Porque foges de mim?”.

A estudante de Teologia é convidada a sair do convento onde estudava por ir longe demais nos seus sacrifícios. As freiras apontam correctamente a falta de humildade e dignidade dos seus actos, mas falham ao interpretá-los como penitências. O interesse de Céline é apenas ver o invisível – o impossível, portanto. De volta a Paris, conhece Yassine, um muçulmano da sua idade, que eventualmente a apresenta ao irmão mais velho, um crente em Maomé que cedo descobrimos não ser tão tolerante quanto parece. De uma religião à outra é apenas um saltinho, porque o extremismo, seja no ódio ou no amor, é cego e qualquer solução fácil se pode maquilhar de certa.

Céline não vê culpados – “Ele apareceu-me com frequência e fez-me perceber o que é amar, e, no entanto, o mundo está cheio de sofrimento” – e Nassir não vê inocentes – “achas que existem inocentes em democracias, onde eleges os teus representantes?”. Ambos cedem ao terrorismo. Pelo meio, David Dewaele tem uma aparição discreta como uma espécie de messias salvador, que é ironicamente mal aproveitado por quem se cruza com ele e pelo argumento. O calculismo e a frieza do estilo de Dumont realçam, mais uma vez, um mundo de vazios, sem respostas da religião, da política, da polícia ou da sociedade para a imigração, para o crime ou para as novas gerações.

7/10

quarta-feira, 12 de junho de 2013

Eden Is West (Costa-Gavras, 2009)

É aos EUA que é normalmente atribuído o epíteto de terra das oportunidades, mas para emigrantes do norte de África ou do Médio Oriente, talvez a Europa pareça tão ou mais atractiva. Todos os anos ouvimos falar de travessias clandestinas de barco pelo Mediterrâneo de pessoas que apenas procuram uma vida melhor mas esbarram contra aproveitadores, políticas restritivas ou mesmo a morte.

Eden Is West começa então à deriva. Dois amigos de nacionalidade desconhecida sonham com a França, estudaram a língua durante um ano e compraram viagens ilegais para lá chegar. No entanto, um encontro nocturno com a polícia marítima obriga-os a entrar em modo de sobrevivência e saltam do barco para nadarem até terra. A manhã revela que pelo menos um deles, Elias, conseguiu.

Costa-Gavras vai testando tons diferentes, não se decidindo entre a comédia de intervenção e o drama de denúncia social. A personagem principal deu à costa num resort de nudismo, primeiro é confundido por um dos empregados, depois consegue passar por cliente, e vai jogando com as circunstâncias para tentar evitar ser apanhado. A sua inocência e honestidade costumam protegê-lo.

Quando acidentalmente é escolhido para auxiliar o espectáculo dum mágico e, no fim, este lhe deixa um contacto em Paris, Elias assume que se chegar à capital francesa terá emprego assegurado no showbiz. Depois de muitas cambalhotas na cama de uma turista alemã, a sua simpatia vale-lhe dinheiro suficiente e uma brecha para seguir em frente.

Ao contrário de outras alturas no passado, o realizador grego prefere, desta vez, ser mais contido nas asserções políticas, mas não deixa de ficar patente a ideia de que se calhar os europeus têm de rever algumas prioridades e de que são menos tolerantes do que julgam. Claro que a imigração tem limites, mas os dispositivos em vigor que a controlam podem ser desumanos.

A sequência dos ciganos acaba por resumir bem o filme: um grupo auxilia Elias a fugir da polícia, julgando-o um deles, e quando percebem o equívoco, riem-se e levam-no para um acampamento, que algum tempo depois é atacado. Os gags sucedem-se, uns com mais piada, outros com menos e alguns ainda simplesmente bizarros, como os camionistas alemães que parecem prontos a abusar de Elias.

Como as personagens falam todas línguas diferentes e Elias não percebe metade do que lhe dizem, Eden Is West ganha contornos chaplinescos, como uma fábula sobre promessas que não se cumprem. Riccardo Scamarcio é fantástico, mas, nesta maior ligeireza, Costa-Gavras deixa o filme arrastar-se no resort e acaba por não lhe dar nenhum momento para mais tarde recordar.


6/10

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Veronika Decides To Die (Emily Young, 2009)


Veronika Decide Morrer é talvez, a par de O Alquimista, o livro mais famoso de Paulo Coelho, o escritor brasileiro que para uns encontra na espiritualidade resoluções para sentimentos como o medo e o amor, e para outros apela à pieguice através de charlatanismo. Sarah Michelle Gellar assume o papel principal de uma jovem que não consegue deixar de estar permanentemente insatisfeita, se não com o rumo que a sua vida tomou, então com o rumo que a sua vida pode tomar. Há pessoas assim, que nem recebendo todo o dinheiro, toda a beleza, todo o carinho do mundo deixam de ter pena de si próprias. Por vezes, estes casos justificam-se com questões pessoais de fundo há muito enterradas ou com distúrbios mentais, que os tornam merecedores de simpatia e compreensão. Lembro-me de Face To Face de Ingmar Bergman, um filme verdadeiramente visceral e envolvente sobre esta situação.

Veronika Decides To Die não chega tão longe, limitando-se a uma superficial procura de significado existencial, partindo da ideia sufista (a corrente mais contemplativa do Islão) de que todos somos um bocadinho loucos, simplesmente alguns perdem o controlo, para chegar à ideia de que a forma de lidar com um pessimista é fazê-lo crer que o pior está a acontecer e rezar para que tenha sido manipulado o suficiente para começar a ver o melhor em tudo. Há muitas más concepções sobre os procedimentos psiquiátricos aqui, porque enfermeiros agarrarem à força um paciente que mostra espontaneamente os primeiros sinais de melhoria, apenas falando pela primeira vez ao fim de muito tempo internado, é uma distorção da realidade, mas com a música certa torna-se um belo momento dramático; a história é fina e incongruências destas são formas baratas de sentimentalismo. Não quer dizer que não hajam cenas genuinamente tocantes, lembro-me da visita dos pais de Veronika na instituição para a qual é enviada depois da sua overdose voluntária de medicamentos, no entanto até essas sofrem quase sempre com maus diálogos, má direcção de actores ou de prolongamento desnecessário.

A componente mais romântica, em que o relacionamento com um catatónico a faz reavaliar a sua existência e o transforma no namorado perfeito sem grande explicação, também não sai ilesa. Há pouca noção de ritmo, o que, associado a uma realização que se limita a movimentos aleatórios, a focar só o que está em primeiro plano, entre outros truques que acabam por não fazer transparecer a claustrofobia, proximidade e desgraça iminente que se calhar se pretendia, estende um manto de mediocridade sobre o filme. Eu não deixo de gostar da Sarah Michelle Gellar e de achar que o seu esforço enquanto protagonista é mais que satisfatório, para não falar de Melissa Leo e Erika Christensen, também elas residentes na instituição, e agradeço aos argumentistas a redução ao essencial do misticismo frequentemente parolo de Paulo Coelho, mas o material de origem já não é, digamos, muito eloquente, e a execução de Emily Young não o eleva a outro nível.

5/10

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Cherrybomb (Lisa Barros D'Sa, Glenn Leyburn, 2009)


Entre o quinto e o sexto capítulo da saga Harry Potter, uma das suas caras mais reconhecíveis, Ron Weasley (aliás, Rupert Grint no bilhete de identidade), envolveu-se neste pequeno filme indie sobre um trio de jovens com particular aptidão para atrair sarilhos. Interpretando Malachy, funcionário do Titanic, um complexo desportivo com ginásio, piscina e muito mais, tenta abraçar um registo diferente, assumindo o papel de protagonista balbuciante e mudando o penteado para uma poupa simplesmente ridícula. Junta-se-lhe Robert Sheehan (que, pelos vistos, fez algum sucesso numa série televisiva qualquer) como o side-kick desnorteado e agressivo, e tem-se... 0% de polpa e 100% de embaraço.

Eles tentam representar, há bastante esforço, mas apenas o vértice feminino do triângulo amoroso que vemos formar-se entre Malachy, Luke e Michelle (Kimberley Nixon) o faz com naturalidade, agarrando-se à evolução da sua personagem e às razões do seu comportamento e não a trejeitos irritantes. Ela foi forçada a viver com o pai, gerente do Titanic, o que facilita o seu encontro com Malachy, que se deixa levar pela rebeldia calma de Michelle e a apaixonar-se. Luke não tem morais e apenas a quer para sexo, não se importando de prejudicar Malachy pelo caminho, se for necessário. Apesar disso, o filme parece querer sugerir uma amizade inquebrável entre os dois, ainda que talvez não seja bem assim.

Os rapazes competem pela atenção da rapariga, embarcando numa espiral de excessos, uma jogo compreensível para Luke, filho de um toxicodependente e irmão de (presume-se) um empresário/traficante de droga, mas não para Malachy, que tem um emprego estável, uma família que o apoia e o mínimo de noção do que é socialmente aceitável. Ao entrar neste esquema de delinquência de forma irresponsável torna-se uma personagem frustrante de seguir. O filme evolui dolentemente de uma festa para uma conversa desenxabida para outra festa, arrastando clichés sobre juventude, posses ensaiadas e diálogos sem sentido. Não obstante, usar SMS como intertítulos é bastante inteligente.

Tudo é awkward e genérico até mais não. Robert Sheehan replica toda uma plêiade de tiques distrativos até ao trágico fim, em que um ato de violência parece comprometer o seu futuro (somos deixados em suspenso, com declarações de Malachy e Luke sobre o poder da amizade e por ai fora, isto apesar da falta de química e entendimento entre os dois ao longo do filme). Fica a sensação de que derrama sangue egoisticamente, para nele diluir a sua raiva e as suas frustrações. Há um ou dois bons momentos de descoberta e sinceridade, como a cena de sexo adolescente e uma invasão ao Titanic de noite; pouco para um projeto que prometia revelar todo o potencial de Ron Weasley. Aliás, Rupert Grint.

3/10

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

A Christmas Carol (Robert Zemeckis, 2009)


Presumo que pouca gente se lembrará, mas num qualquer Natal na primeira metade da década de 1990 saiu em VHS com o Diário de Notícias a versão animada de 1982 de A Christmas Carol. Lembro-me bem de ver o filme duma ponta à outra, fazer rewind no leitor e repetir o processo ad infinitum, fascinado pelo negrume melancólico das cores usadas e da mente de Ebenezer Scrooge, sempre pontuado por pequenos momentos de humor e rematado com o conforto da esperança. Mais tarde viria a descobrir o livro e a encontrar nas palavras de Dickens um reduto maior do que quaisquer imagens podem deslindar.

Ao saber que Robert Zemeckis se ia aventurar a realizar a sua própria visão deste conto, não pude deixar de ficar apreensivo. Não é que possam haver grandes dúvidas sobre a sua capacidade, depois da qualidade da animação de Polar Express e Beowulf, mais cliché, menos cliché nas histórias - simplesmente uma produção de Hollywood desta envergadura de um clássico da literatura aumenta a possibilidade de ser mais vista e definitiva que as que se lhe antecedem. Ao longo dos anos, muitos foram os filmes feitos à volta do Natal de Dickens, que esperar agora deste?

A abrir, um grande plano de Marley num caixão, com pennies no olhos. Jim Carrey aparece então, irreconhecível, de queixo saído, nariz pontiagudo e meio corcunda, debaixo de gráficos de computador topo de gama, como Scrooge, forçado a pagar o funeral do seu sócio defunto, e o carácter do velho arrieiro é imediatamente revelado: contrariado, tira duas moedas da sua carteira para o dono da funerária e, antes de sair, tira também as moedas do rosto do cadáver para a sua carteira. Segue-se um prodigioso plano-sequência pelas ruas e sobre as ruas da Londres invernal do séc. XIX enquanto rolam os créditos iniciais.

Scrooge é somítico e deprimente. Não acredita na essência do Natal, acha que todos os homens são inerentemente maus e conformistas e escolheu há muito tempo isolar-se do mundo com a sua fortuna. Por isso não é surpresa quando recusa ir passar o serão a casa do seu sobrinho Fred (a única família que tem), quando recusa dar dinheiro a uma instituição de caridade e quando maltrata verbalmente o seu funcionário Bob Cratchit por ter de lhe dar folga no dia 25 de Dezembro. À noite, 3 fantasmas visitam Scrooge para lhe lembrar quem foi, mostrar no que se tornou e qual pode ser o seu destino.

A história, sobejamente conhecida, é respeitada e desenvolvida com um ritmo rápido, com Zemeckis a criar cenas de ação para as transições entre passado, presente e futuro, que acabam por resultar bastante bem e não comprometer a melancolia dum enredo simultaneamente linear e anacrónico, um mecanismo que justifica parte do louvor dado a este conto. A assombração de Marley anuncia de forma assustadora uma viagem pelo tempo que se espera ser suficiente para mudar o negativismo de Scrooge. Imaginei-me criança e a sentir-me, tal como ele, afetado pelas imagens macabras evocadas pelo último espectro.

Mas esse é o poder do Natal e o poder do cinema, dois conceitos elevados, capazes de elevar o espírito e de oferecer sobressalto, perspectiva e conforto. Filmado em IMAX 3-D e através de motion-capture, o filme de Zemeckis consegue oferecer um retrato vívido dos contrastes da época, consegue estimular os sentidos do espectador com belos planos, cores e diálogos e consegue gerar um Scrooge memorável, auxiliado pelo talento de Carrey para criar personagens. A Christmas Carol é uma história eterna de redenção que, seja em livro, no cinema, na televisão, em VHS, DVD ou BD, vale sempre a pena revisitar.

8/10

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Loose Change 9/11: An American Coup (Dylan Avery, 2009)

O 9/11 foi provavelmente o acontecimento mundial mais importante após a Segunda Grande Guerra, não só pelo choque e dimensão dos eventos desse dia, mas também pelas consequências sociais e económicas que teve e que se fazem sentir ainda hoje, de tal forma que a incredulidade perante o sucedido tem gerado, desde então, uma miscelânea de teorias de conspiração. Muitas delas rejeitam a explicação oficial de um ataque terrorista massivo e acusam antes o governo americano de ter orquestrado tudo, por vezes de formas infundadas. Loose Change tenta apresentar dados credíveis que possam suportar esse sentimento.

O documentário de Dylan Avery começa e acaba com enquadramento histórico, como um prólogo e um epílogo que indiciam precedentes de ataques sofridos pelos EUA, retaliações falaciosas dos EUA e maquinações internas nos EUA. No meio, investiga-se; os mais inconformados dirão que se procura a verdade, os mais cépticos dirão que se entra em negação. Seja como for, é irresponsável renunciar factos. Avery afirma que o 9/11 foi gerado por "war games", ou seja, simulações militares reais de cenários de guerra, que correram mal ou foram desenhados propositadamente para correrem mal e tem muito por onde pegar.

Onde estavam os jactos do exército que podiam interferir com a trajectória dos 4 aviões? Porque é que o Boeing 757 que chocou contra o Pentágono fez no edifício um buraco do tamanho da minha cozinha? Como é que não foram encontrados destroços do voo 93 em Shanksville, Pensilvânia, algo inédito na história da aviação mundial? Sabiam que 9 dos supostos pilotos suicidas foram encontrados com vida em países árabes ou africanos nos últimos 10 anos? O que aconteceu realmente no WTC 7, o terceiro edifício que ruiu, em queda livre, em Nova Iorque nesse dia?

Há muitas pontas soltas, o que se seguiu foi deplorável e Bush, a sua família e os seus colaboradores mais próximos não têm um currículo que abone em seu favor. Há muita especulação, mas Avery consegue pôr o espectador a pensar. A narração de Daniel Sunjata é grave e cativante. Loose Change não encerra todas as respostas, claro, mas levanta questões importantes, com suposições verosímeis, documentos reveladores e testemunhos paradoxais. Não podemos aceitar tudo o que nos é dito. Ainda em 2004, José Maria Aznar mentia sobre os atentados de Madrid, aqui ao lado, em Espanha. A extensão que os segredos dos EUA, única superpotência mundial, podem ter é inimaginável...

8/10

IMDb

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

My Son, My Son, What Have Ye Done (Werner Herzog, 2009)

É curioso que David Lynch seja o produtor deste filme, pois My Son, My Son, What Have Ye Done está mais próximo da sua filmografia que da de Werner Herzog, o realizador. O que temos aqui é, então, um trabalho muito complicado, por um lado previsível e fanado, por outro lado bizarro e perturbador. Brad McCullum (Michael Shannon) enceta uma viagem ao Peru com amigos (um destino do agrado de Herzog), da qual volta sozinho depois de muito descuido na prática de canoagem. Durante o ano seguinte, o seu comportamento vai-se tornando cada vez mais errático e acaba por incorrer em matricídio. O filme é pouco convincente em mostrar a suposta involução psicológica de Brad, um zombie ambulante com zero de carinho pelos que o rodeiam, excepto pela sua mãe, na presença de quem se torna subserviente e pusilânime, e com zero de interesse em tudo o que faz, excepto numa peça sobre Orestes, na qual tem o papel principal.

É claro que Mrs. McCullum (Grace Zabriskie) o castrou, não fisicamente (presumo) mas mentalmente, criou sozinha o filho num ambiente de co-dependência e infantilidade ao qual Brad parece não querer ou conseguir escapar. Numa cena, depois de a sua noiva, Ingrid (Chloë Sevigny), lhe ter recomendado sair de casa, o jovem sugere mudarem-se os dois para a casa ao lado, ou para a seguinte, ou para a casa em frente. Claro que Ingrid não fica agradada, pois percebe que o deve afastar da influência maternal, mas pouco faz para isso ou para ajudar a curar as feridas que o sucedido no Peru eventualmente terá deixado em Brad. Ele parece sofrer duma apatia enervante (e este tipo de pessoas normalmente não anda a fazer viagens e peças de teatro, só que personagens bem pensadas não é o forte deste argumento), mas talvez não tão danosa quanto a apatia de Ingrid ou do director da peça, Lee (Udo Kier num registo frouxo), por exemplo. Andam com ele dum lado para outro, sempre preferindo ignorar os problemas de Brad a confrontá-lo com eles. Agora apenas têm a Mrs. McCullum talhada e embrulhada num saco de plástico, a SWAT a tentar tirar Brad de casa e café barato na mão, oferecido pelo excessivamente bondoso detective (Willem Dafoe) a quem têm de recontar o passado recente, que vemos em inúmeros flashbacks.

É, no entanto, difícil ver esta trapalhada toda e não ficar um pouco fascinado com alguns dos momentos mais esotéricos que Herzog plantou aleatoriamente. Num deles, Brad e o seu tio Ted estão num bosque coberto por neve a planear um anúncio e um anão deambula por perto. O enquadramento é tal e a estranheza é tanta que não deixa de ser interessante. Noutro ponto, uma câmara portátil digital filma em POV um mercado chinês, seguindo vários idosos, que vão olhando para a lente. Porquê? Não faço a mínima ideia, mas não deixa de ser interessante. São estes detalhes que fazem My Son, My Son, What Have Ye Done parecer mais David Lynch que Werner Herzog e, francamente, são os poucos pontos de relevo desta salgalhada. Sem rumo, sem textura, sem voz, este é um filme bastante intragável e completamente irrelevante.

4/10

IMDb 

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

The White Ribbon (Michael Haneke, 2009)

O rótulo de autor sempre foi anexado a Michael Haneke com naturalidade, pela forma como consegue sobrepor a sua visão ao processo colectivo de produção. Cada filme reflecte as suas considerações técnicas e temáticas com rispidez, mas percorrendo caminhos diferentes, o que lhes garante uma identidade muito própria. The White Ribbon separa-se logo no início pelo uso inédito do preto e branco e por haver um narrador, o que apenas aconteceu anteriormente em The Castle. Ser-nos-ão relatados os estranhos acontecimentos que precederam o início da Primeira Guerra Mundial numa aldeia alemã e espera-se que, ainda que vagos e episódicos, possam parecer sintomáticos do futuro iminente do país.

As respostas a grandes perguntas nem sempre são claras ou fáceis, como cedo descobre o filho do médico da vila. Na cena inicial, o seu pai sofre uma queda aparatosa de cavalo que dificilmente se pode confundir com um acidente. O menino pergunta então à irmã mais velha o que significa morrer e não gosta do que aprende. A morte é um assunto recorrente, quanto mais não seja pela forma como condiciona a vida do grande leque de cidadãos da vila, vidas de trabalho e fé, e a fé incorre em dualismo, tanto pode ser responsável por actos de bondade como de maldade. A Haneke interessa os factos, as explicações deixa-as para quem se atreve a analisá-los.

Como tal, o que será pior? Acreditar na inocência de uma criança mas constantemente atentar contra ela, como o padre, ou protegê-la mas perceber que pode ser comprometida, como o professor? Esta é uma questão menor, que é explorada quando, depois do que aconteceu com o médico, a incompreensão e o medo se instala à medida que se sucedem actos de vandalismo e violência cada vez mais enigmáticos. As crianças são particularmente vulneráveis, mas todos vivem reprimidos pelas dinâmicas de culpa e castigo que a religião e a sociedade impõem. Qual é o grau de estabilidade que isso acarreta afinal, quando nem a casa e a família são um reduto?

A ambiguidade bate à porta. As crianças são imperscrutáveis e arguciosas mas referidas pelo nome, os adultos são óbvios e tépidos mas referidos pelo estatuto. Apenas o professor parece trazer algum equilíbrio e é provavelmente a personagem mais simpática que Haneke já escreveu. Encontra o amor, as suas intenções são honrosas e os seus modos justos, pelo que não é de estranhar ser ele o narrador, aquele que parece tão interessado em compreender o que testemunhou quanto o espectador. No fim, a História assalta-nos e o contexto torna-se relevante. Deveremos nós viver e estaremos nós a viver no mundo de regras que os adultos sustêm, no mundo de liberalismos que as crianças teriam o direito de projectar ou no mundo intermédio do professor e da sua namorada, Eva?

Haneke aponta em várias direcções, sempre com o máximo de espírito crítico e clareza, aqui aumentada pelos contrastes frios da brilhante cinematografia de Christian Berger. A beleza de alguns planos parece sempre ameaçada pelo silêncio dum filme sem banda sonora ou pela prostração das personagens à violência do dia-a-dia. O padre é presenteado com um pássaro pelo filho mais novo, que o criou para substituir o que havia no escritório do pai. Haneke parece pessimista, mas há esperança. The White Ribbon é, ao mesmo tempo, o seu mais acessível e amplo filme - um triunfo dum cinema económico, não-conformista e paciente que Haneke domina como ninguém.

9/10

IMDb 

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

The Secret In Their Eyes (Juan José Campanella, 2009)

2009 deveria ter sido o ano da consagração universal de Michael Haneke. Com The White Ribbon, o realizador austríaco ganhou a Palma de Ouro em Cannes, o Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro e estava nomeado para o Óscar com a mesma designação. Deveria, mas não foi, e The Secret In Their Eyes foi o culpado. Com Juan José Campanella por detrás das câmaras, alguém com a realização de episódios de Dr. House como ponto de maior interesse no currículo, este não pareceria sequer, à partida, um candidato a derrubar o favorito Haneke nos maiores prémios do cinema americano. À partida.

The Secret In Their Eyes é um thriller discreto. Já foram feitos episódios de CSI mais complexos, mais estrondosos ou mais chocantes. Não, a sua essência não passa por ai. O caso é resolvido a meio do filme, as explosões à Hollywood são substituídas por montanhas de burocracia e a única cena susceptível de ferir sensibilidades aparece logo no início e rapidamente. Benjamin Esposito (Ricardo Darin) não esquece o caso Morales. Agente federal retirado, divorciado, decide dedicar-se a escrever um livro sobre o passado que nunca esqueceu.

O filme desdobra-se em duas linhas temporais diferentes. Enquanto no presente Esposito tenta completar o puzzle da sua vida e juntar as peças do caso e da sua amizade com Irene (Soledad Villamil), a sua eterna superior e destinatária do seu amor nunca confessado, mais de 20 anos antes o agente é chamado a investigar a violação e assassínio de uma jovem, Liliana, casada com Morales. Parte da eficácia do filme passa por aqui, no equilíbrio entre o que está para resolver e o que ainda não foi resolvido, mas também no equilíbrio entre a seriedade que a história exige para nos tocar e a descontracção que as personagens precisam para respirar.

Esposito e o seu colega Sandoval esbarram constantemente contra a hipocrisia do sistema, a devoção (primeiro) e a conformação (mais tarde) de Morales e os seus próprios problemas. Apesar do apoio precioso de Irene, parece que nunca conseguem dar ao caso uma conclusão satisfatória. Nem ao caso, nem às suas vidas. Sandoval é um alcoólico inveterado; Esposito é um eterno solitário. A sua química com Irene é inegável, mas não lhe consegue dar seguimento. Os olhos falam e ambos parecem insatisfeitos. Daí a importância do presente. Porque nunca é tarde demais para tentar viver uma vida cheia, para encontrar respostas.

O estilo é moderno e sóbrio e Campanella eleva o seu trabalho a outro patamar numa set-piece central que engloba a captura do suspeito principal do assassínio de Liliana num estádio. Estou a salientar esta cena porque é um dos planos-sequência mais geniais que já vi - começa com um plano aéreo, vemos o jogo a decorrer e as bancadas cheias, a câmara parece fazer um voo picado sobre o relvado e encontrar Esposito na bancada, movendo-se entre os fãs até encontrar quem procura e o perseguir dentro do estádio até o apanhar. Filmado em várias fases, primeiro de helicóptero, depois com gruas e, por fim, com câmaras mais móveis, tem um total de 7 cortes disfarçados em computador para criar o efeito de continuidade final. É uma maravilha da tecnologia.

Perto do fim, Irene e Esposito discutem o dramatismo negativista e lamechas do último capítulo do livro dele. The Secret In Their Eyes não acaba da mesma forma, antes pelo contrário, contido mas com um piscar de olho e um sorriso. É curioso que alguém como Campanella, com um passado tão ligado à televisão, tenha inviabilizado Haneke, um grande crítico da caixa mágica, de receber uma honra tão grande como o Óscar, mas a qualidade de The Secret In Their Eyes é incontornável - uma agradável surpresa.

8/10

IMDb