O público e os críticos não
souberam muito bem como receber Only God Forgives quando saiu. Os sinais são,
efectivamente, confusos; se, por um lado, Ryan Gosling dá a cara por mais um
filme de Nicolas Winding Refn, logo a seguir ao sucesso de Drive, que tinha um
fio condutor bastante bem definido e apresentava convenções dos filmes de
acção, como os interesses amorosos da treta (o amor é tão mais lindo quanto mais
difícil for consumá-lo) ou os acidentes de carro exagerados pela indústria
cinematográfica (há apenas um, que é criado mesmo para uma cena dum filme), de
uma maneira lúdica e estilizada por um olhar europeu mais clínico, por outro
lado aqui temos Gosling (Julian) a delirar com amputações, com a mesma gravidade
que os sonhos de Max Payne tinham no videojogo com esse nome, e a única relação
da personagem principal remotamente possível é criada artificialmente (não há
sentimento, ele apenas paga a uma prostituta que vê com frequência para
apresentar à mãe como namorada) para ser destruída logo de seguida, com a
facilidade de uns berros e ameaças. Only God Forgives retém o desejo de brincar
com géneros, tendo-o descrito o próprio realizador como um western no extremo
oriente e com um anti-herói moderno, mas também está presente a herança do
noir, no esquema polícia-e-ladrão, nos combates underground e nos biscates da
máfia. Por agregar uma maior quantidade de elementos numa estrutura narrativa
mais dispersa, o filme agarra menos que Drive, é mais frio, mais soturno, mais
distante, mais violento, merecendo assim comparações com Valhalla Rising em
igual medida às feitas com Drive. De um ponto de vista estilístico, temos aqui
uma obra-prima; Refn aposta nos néons e nas lâmpadas coloridas dos clubes de
strip para atingir um visual desconcertante, adequado à seriedade demente do
tenente Chang, que inicia uma cruzada contra a família criminosa de Julian.
Julga-se o salvador de uma cidade de pecado e deixa um rasto de sangue atrás de
si. O motivo que inicia tamanha carnificina é algo aleatório e já vimos esta
premissa centenas de vezes. Gosling está mais letárgico que enigmático, e não é
possível assumir protagonismo quando aparece Kristen Scott Thomas como a
matriarca white trash, sem escrúpulos ou papas na língua. Mas Only God Forgives
vale, acima de tudo, pelo ambiente. É de cortar à faca. Ou à espada.
7/10