A história da pantera cor-de-rosa
começa nestes filmes de Blake Edwards. Foi em 1963 que estreou The Pink
Panther, originalmente um veículo para David Niven, que acabou por se tornar
num one man show de Peter Sellers, na altura um ator secundário, e o catapultou
para o topo da lista dos homens mais engraçados do planeta Hollywood. Nos
créditos iniciais, a personagem animada que se tornaria um cartoon inolvidável
e que servia apenas como analogia ao enredo sobre um ladrão de jóias de olhos
postos num diamante raro na posse duma princesa. Niven passar para segundo plano
é a prova de que não há fórmulas para os gostos do público e o sucesso por
razões inesperadas do filme só podia dar em sequelas, com o foco apontado para
outro lado.
Por conseguinte, A Shot In The
Dark deixa para trás tudo exceto o inspetor Closeau, personagem literalmente
criada por Sellers como um homem digno mas sem noção, que os argumentos se
encarregam de pôr a resolver o mais rebuscado dos casos da mais estapafúrdia
das formas. Num longo e, primeiramente, incompreensível plano-sequência, a
câmara olha para dentro de uma mansão, seguindo várias pessoas pelas janelas, a
subir escadas, a entrar em quartos, a esconderem-se uns dos outros, até que
alguém é assassinado. Dá logo vontade de voltar atrás e decifrar quem é quem, mas
é mais divertido seguir em frente e deixar Closeau chegar. A loira, curvilínea
e despassarada Maria Gambrelli (Elke Sommer) é desde cedo identificada como
principal suspeita na morte do chauffeur Miguel, mas o inspetor não acredita
nessa possibilidade, seja por causa do seu inimitável instinto ou por estar
perdido de amores pela criada da mansão do milionário Ballon (George Sanders,
sempre irredutível).
Blake Edwards simplifica a realização
ao máximo: instala a cena e simplesmente deixa 2 ou 3 câmaras a rolar, à medida
que Sellers desenvolve com toda a naturalidade elaborados gags e entrega os
seus diálogos ao ritmo que lhe parece melhor. Comprometer a componente técnica
para servir a comédia não seria mau, se as piadas valessem todas a pena, o que
não acontece. As cenas numa colónia de nudistas e quando Closeau tenta fazer de
Ballon um arguido à medida que os dois jogam bilhar são risíveis e fazem A Shot In The Dark valer a pena, mas há também bastante exagero nesta liberdade total
dada a Sellers, e que resulta em alguma falta de objetividade do filme, notória
sempre que são repetidas as absurdas conclusões do agente policial ou as
aleatórias aparições de Kato, o seu criado asiático (e aprendiz de artes
marciais).
Os assassinatos sucedem-se, os
corpos empilham-se e a conclusão destes mistérios fatais é surpreendente. Herbert
Lom tem uma aparição subestimada enquanto o superior de Closeau, lentamente
levado à loucura pela total incompetência do seu subordinado, que, sabe-se lá
como, consegue resolver os crimes. Há muita sofisticação tanto na construção da
personagem principal, como na whodunnit que está na base de A Shot In The Dark,
mas a falta de ritmo e a direção pouco objetiva de Blake Edwards fazem o filme
arrastar-se e nem sempre ser merecedor de gargalhadas, ficando apenas reforçada
a opinião de quem refere The Pink Panther Strikes Again como a melhor sequela.
Mas que não haja confusão: Peter Sellers é um génio.
5/10