terça-feira, 3 de setembro de 2013

Zero Dark Thirty (Kathryn Bigelow, 2012)

Kathryn Bigelow e Mark Boal regressam ao cenário da geopolítica num mundo pós-11 de Setembro com um filme sobre a busca e morte de Osama Bin Laden, adequadamente apelidada de a maior caça ao homem de sempre, tendo-se prolongado por 10 anos, decorrido em simultâneo com duas guerras e envolvido um sem número de meios materiais e humanos. Em comum com The Hurt Locker temos a estrutura episódica do argumento, aqui inclusivamente separados por subtítulos, a falta de arcos dramáticos na construção das personagens, realçando o compromisso total que estabelecem com os seus trabalhos, e o realismo irrepreensível. Felizmente, em Zero Dark Thirty nada disto é atabalhoadamente direccionado para uma mensagem confusa no final nem se torna repetitivo ou frouxo à medida que o tempo avança.

O âmbito é extenso, passando com agilidade de actos públicos marcantes, como aquele dia de 2001 em Nova Iorque, usando apenas gravações reais de chamadas feitas das torres e dos aviões sobre um ecrã negro, o atentado ao hotel Marriot em Islamabad ou as bombas de Londres em 2005, para cenas de trabalho de investigação exaustivo por vezes tão desesperantes quanto as outras (efeito conseguido com a mesma eficácia que em casos exemplares como All The President’s Men ou Zodiac), criando expectativa quanto a um desfecho já sobejamente conhecido, o cerco ao complexo de Bin Laden no Paquistão em 2011, que encaixa em ambas essas facetas e é, efectivamente, um momento de enorme tensão e excelência técnica.

Nunca vemos a cara do líder da Al-Qaeda e a reacção de Maya, a estóica operacional da CIA que abdica de ter uma vida própria para o encontrar, quando o corpo é levado ao seu encontro num saco de plástico para reconhecimento visual, não resolve nada, apenas assinalando que a missão foi completada e permitindo finalmente, ao fim de tanto tempo gasto e sangue derramado, uma amostra de humanidade em estado bruto sob a forma de um ataque de choro, ainda assim sem o mínimo de sensacionalismo, sem música, sem discursos bonitos e sem, sequer, a proximidade de alguém para a reconfortar.

The Hurt Locker até podia ser bastante competente, mas não lhe deslindo uppercuts como este; a secura de Zero Dark Thirty impressiona, tornando-se importante manter a cabeça fria para não interpretar as cenas de tortura, os tiros à queima-roupa na Operação Lança de Neptuno ou a corruptibilidade dos informadores árabes como mais do que uma tentativa de retratar o que aconteceu (ou fomos ditos que aconteceu, dirão os mais cépticos). Da vingança à justiça vai um longo caminho e este filme não entra nessa discussão (para isso já tivemos Munich uns anos antes). Assim, com clareza e sem compromissos, o estilo de Bigelow, a escrita de Boal e o talento de Jessica Chastain fundem-se com o negrume e a gravidade da situação e atingem aqui os seus melhores momentos até agora.

9/10

3 comentários:

  1. Ótimo texto, realmente é um filme seco, com um belo roteiro e uma grande interpretação Jessica Chastain.

    Abraço

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    1. A Jessica Chastain está muito bem mesmo e agora percebo o porquê da competição que houve no ano passado para o Óscar de Melhor Actriz; com a Jennifer Lawrence e a Emmanuelle Riva, houve um trio de enormes interpretações por onde escolher.

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  2. Não diria melhor, um filme que a seu tempo, estou convencido, terá mais valor. Só a cena final da investida e captura de Bin Laden confere ao filme um estatuto muito muito bom. Totalmente de acordo.

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