domingo, 23 de setembro de 2012

Il Posto (Ermanno Olmi, 1961)


Ermanno Olmi autoproclama-se um inversor do neorealismo, o que constitui uma de duas razões que me levam a duvidar da validade do seu espírito de crítica. Trabalhando o dia-a-dia de pessoas comuns e a adequação individual à sociedade em redor, com intenção de capturar, ao invés de dramatizar, a verdade, nunca abdicando de filmar no local ou de utilizar não-actores, fica a sensação de que dificilmente alguém se inseriria melhor no género do que ele próprio. Nenhum exemplo será tão bom quanto Il Posto, um filme simples que não abdica do comentário social.

Seguindo um jovem residente nos arredores de Milão em processo de candidatura a emprego numa grande empresa da cidade da Lombardia, Olmi consegue desde cedo atingir um nível de grande perspicácia quanto à monotonia e assepsia física e emocional dos processos e ambientes de trabalho modernos, feitos de testes e tarefas intermináveis com propósitos ininteligíveis e com pouco espaço para relações humanas relevantes. Felizmente para Domenico, conhece Antonietta antes que se possa processar qualquer tipo de estandardização de sensibilidade.

O filme acaba por ter duas fases: numa primeira, impera a dúvida sobre a colocação ou não dele nos quadros da empresa. Aprovado, começa como mensageiro e depois passa a escriturário. Numa segunda, questionamo-nos sobre o futuro em conjunto destes jovens. Aqui já não temos resposta. Apesar do óbvio entendimento entre eles, parece haver uma terceira entidade invisível a conspirar contra eles, colocando-os ao serviço em edifícios diferentes, separando-os à hora de almoço na cantina e impedindo-os de se encontrarem no baile de fim do ano.

É aqui que, voltando ao início, faço outro reparo e acho que Olmi perde um bocado as rédeas do filme, no seu esforço de mostrar um vislumbre do possível futuro de Domenico, que não é senão o negro presente dos seus colegas mais velhos, uma vida solitária e sem estímulos. A percepção do potencial desumanizador de um mundo urbano ultra burocrático e regularizado é perfeitamente suportada pela monotonia do quotidiano, do preto e branco e do estilo quase documental, não precisando de muletas como personagens secundárias irrelevantes.

O argumento passa a andar à deriva quando decide que é necessário maximizar o alcance e temos pistas de intrigas e depressões entre funcionários. A dada altura, chega a festa da companhia, a que Antonietta acaba por não ir, uma sequência belíssima com algum embaraço e humor, mas na qual o foco alterna entre a diversão agridoce de Domenico com um olhar superficial e desinteressante sobre outros convidados. É fazer demais, e quando, já no escritório, se luta pela secretária melhor de um homem recentemente falecido, a imoralidade é universal e não precisa de background.

Já em I Fidanzati tinha ficado com a impressão de se estar a complicar o que é simples. É a prova de que há uma linha que separa as pequenas ideias que conseguem adensar uma história eficazmente das que acabam por enublá-la. Afinal, um emprego seguro não me parece nada mau e quem sabe o que o futuro trará. Il Posto não deixa de ser historicamente relevante, por se ver uma Itália pacífica e em desenvolvimento rápido nos anos 50-60, e emocionalmente genuíno, pela calma atenção prestada ao quotidiano. É o L'Eclisse (Michaelangelo Antonioni, 1960) do proletariado e com uma nota de esperança, intencional ou não.

7/10

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