Já vos aconteceu verem ou reverem um filme que sempre
deixaram na lista de espera por saberem da sua reputação duvidosa ou do qual
tinham uma impressão negativa e um dia finalmente escolhem sentar-se em frente
ao ecrã para tirar a prova dos nove e no fim acham que até nem era assim tão
mau? Comigo passou-me mais recentemente com 9 ½ Weeks. Descrito na altura como
o filme mainstream mais erótico desde Last Tango In Paris (que para mim sempre
foi mais deprimente que qualquer outra coisa), foi recebido como um objecto
ridículo e repleto de momentos constrangedores. Não deixa de ser irónico que na
mais pirosa das décadas um filme minimamente sofisticado como este tenha sido
tratado como se já estivesse ultrapassado.
Obviamente, conseguem-se distinguir sinais dos anos 80 em
muitos lados, a começar pela banda sonora (a Slave To Love do Bryan Ferry é
como o algodão, não engana), mas Adrian Lyne sabe usar a cidade de Nova Iorque
para servir a sua história como poucos, basta ver a atmosfera de terror urbano
que emana de Jacob’s Ladder ou a distância emocional que os cenários de 9 ½
Weeks transmitem. Nas assépticas galerias de arte do Soho, nos escritórios de
Wall Street ou nos becos desertos e fumacentos por detrás das grandes avenidas,
os protagonistas encontram validação para se concentrarem na carnalidade. Por
outro lado, a multiculturalidade é usada no início para simbolizar a entrada de
Elizabeth num mundo dos sentidos que lhe é estrangeiro.
O primeiro contacto com John Gray acontece numa mercearia
chinesa e o primeiro encontro num restaurante italiano. A atracção entre ambos
é evidente e o lado brincalhão dele vem ao de cima, especialmente quando no dia
seguinte vão à feira popular. Rapidamente os jogos passam a ser outros e
Elizabeth deixa-se ir, liberta-se, depois de anos presa num casamento que
acabou em divórcio. Em breve passam a haver apenas dois tipos de cenas: aquelas
em que estão vestidos e aquelas em que estão despidos (maioritariamente Kim
Basinger). Beneficiando com a voz fagueira e o estilo enigmático dum Mickey
Rourke pré-cirurgias, o filme consegue manter sempre em fundo um tom de
imprevisibilidade que, compreensivelmente, consegue excitar Elizabeth.
Aqui sim, há muita sensualidade, basta relembrar o mítico
striptease ao som de You Can Leave Your Hat On de Joe Cocker, uma cena que,
como muitas outras ao longo de 9 ½ Weeks, é favorecida pelo trabalho fantástico
ao nível de iluminação, usando as sombras para realçar as curvas da protagonista
e manter a aura de mistério e risco associada à relação. A falta de
sensibilidade de John torna-se evidente mas Elizabeth abandona o barco quando
sente que estão a ser ultrapassados os limites do respeito, mostrando ser uma
mulher forte e fazendo a distinção entre prazer e deboche. Tudo considerado,
quanto muito é um filme longo demais e que desenvolve mal os seus ténues sub-enredos
(ex-marido e o artista), mas não deixa de ter o seu charme.
7/10
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