Os créditos iniciais de Thirst parecem
o prenúncio dum melodrama cheio de movimento e potência sonora, mas não é bem
assim. É verdade que Bergman estabelece um lugar temporal específico e
turbulento, o ano imediatamente após a Segunda Guerra Mundial, mas usa-o apenas
como pano de fundo para realçar a fragilidade dos conflitos pessoais criados,
até porque os seus métodos de desconstrução da narrativa levam-nos para várias
cenas anteriores e posteriores e aparecem aqui como precedentes muito mais
insistentes e interessantes do que qualquer pretensão incomum a fazer um filme
de época.
Efectivamente, identificam-se
vários elementos que viriam a ser-lhe caros, embora num estado proveta que não
leva Thirst a competir em termos de magnetismo e maturidade com os mais
evoluídos The Silence, Persona ou Cries & Whispers. Pego nestes títulos por
ver pistas de cada, ora atentem: 1) uma viagem de comboio, com todos os seus
momentos mortos e paragens obrigatórias ou forçadas, que é rastilho para
catarses; 2) amor/ódio entre duas mulheres que resvala para uma tensão sexual
inegável; 3) saltos na cronologia, incluindo flashbacks que ligam um casal às
memórias dela com o amante anterior e intermissões que anexam ao presente o
destino da amante anterior dele.
Além destas aproximações, resta
uma trama bastante desenxabida. Rut é uma ex-bailarina acossada pelo sofrimento
que representou enrolar-se com um militar casado e com filhos. Para Raoul todos
os homens deviam ter duas mulheres e leva esta teoria tão a sério que a usa
como justificação perante a mulher e Rut quando os três se apanham no mesmo
apartamento. O seu desplante é enorme, a sua honestidade nem por isso. A
brincadeira acaba num aborto com consequências graves. Isto são fragmentos do
passado pré-guerra que completam a paisagem repleta de fragmentos de cidades à
medida que Rut e Bertil, o actual marido, atravessam a Alemanha, seguindo de
Basileia para a Suécia.
Noutro plano, Viola entrou em depressão
desde que acabou com Bertil. Consegue afastar-se dum psicólogo manipulador e
acaba por conhecer uma lésbica, também ex-bailarina e antiga colega imaginem de
quem… A contribuição disto para o conflito entre marido e mulher que, como
muitas outras vezes aconteceria com Bergman, assume o papel principal, sendo
simultaneamente a perdição e a salvação das personagens, é igual a zero, apenas
confirma uma tendência para o atrevimento que ainda se viria a revelar
frutífera. Há muitos elementos para absorver em Thirst, contudo o resultado
final está longe de ser agradável.
5/10
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