domingo, 21 de junho de 2015

La Piscine (Jacques Deray, 1969)

A qualidade cinemática das piscinas é inegável. O azul claro do fundo e a ondulação tênue da água podem transmitir calma ou incerteza, consoante o contexto, e, num filme como La Piscine, onde actores mais-que-perfeitos como Alain Delon e Romy Schneider passam horas a mergulhar e a nadar enquanto sopra uma brisa veranil perto de Saint-Tropez, condicionar a nossa percepção da passagem do tempo pela repetição de um simples movimento. Como o filósofo Gilles Deleuze teorizava, o movimento subordina o tempo no cinema quando a dinâmica das personagens ou objectos estão conectados pela montagem a um centro, que pode ser afectado por ou reflectir algo. Esse centro não precisa de ser um organismo, pode ser um espaço, como o apartamento que liga várias histórias em Vive L’Amour (Ming-Liang Tsai, 1994), nem sequer precisa de ser corpóreo, pode ser uma ideia, como o conceito da greve em Strike (Sergei Eisenstein, 1925). A existência de um centro à roda do qual a dinâmica das personagens ou objectos se relacionam deslinda padrões de acção-reacção e, daí, nasce o enredo.

E quantas vezes não vimos já esse espaço aquático confinado, que tanto serve para diversão, como para desporto, como pretexto para ver alguém em trajes menores, como até para matar alguém por afogamento, ser o centro das atenções? Realmente é o que acontece aqui, a piscina da mansão emprestada onde Jean-Paul e Marianne passam férias é presença activa ou passiva em quase todos os momentos, de início porque o jovem casal (nesta altura já não o eram fora da tela, mas continuavam a exibir uma química incrível, como se vê nos avanços e recuos, beijos e amassos quando ainda estão sozinhos), mais tarde por atrair a estadia do amigo Harry (Maurice Ronet) e da sua filha adolescente (Jane Birkin), e no fim por ser explorado o seu lado mais negro e alguém lá morrer numa noite que tinha condições para ser o mais pacífica possível, como as anteriores.

Tirando isso, pouco acontece. Ou seja, abraçamos a indolência com tanta satisfação quanto a que Jean-Paul e Marianne dedicam às suas férias, perdemo-nos a olhar para estes modelos, a apreciar a paisagem da Cote D’Azur, a desejar saltar para a piscina, que falhamos as intermitências desta união e que são logo apontadas quando ela nem hesita em convidar terceiros, que vêem claramente estragar o isolamento que ele estaria a congeminar. Este é um filme de crime, não fosse o realizador Jacques Deray um habitué do género, um pouco como Swimming Pool (François Ozon, 2003) só que menos meta, todavia é também um filme existencialista, como La Notte (Michelangelo Antonioni, 1961) só que em fase de namoro. Jean-Paul não é tão confiante quanto parece e Marianne duvida mais do futuro da relação do que diz. O crime surge bruscamente e não tem repercussões jurídicas. Cai, isso sim, como uma bomba entre os protagonistas, que terão de decidir se os dois anos de união são para continuar ou não passaram de um vazio (mal) dissimulado. E assim, a piscina desaparece – o seu trabalho está feito.

8/10

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