Já me colaram o rótulo de
obsessivo-compulsivo algumas vezes e eu aceito, consciente de que, felizmente,
se traduz em manifestações de pouca expressão, que me levam a insistir na
arrumação dos espaços que ocupo e na geometria da disposição dos objectos, mas
não da forma doentia que caracteriza os reais portadores deste distúrbio; o meu
dia-a-dia não sofre por eu ser organizado, antes o contrário. Pela atenção que
dá aos detalhes, pela constante procura dos melhores movimentos de câmara e dos
planos mais bem enquadrados e até pelo humor desajeitado, sempre imaginei que o
realizador Wes Anderson se insere também nesta definição. Só isso, à partida, já
me aproxima dos seus filmes.
Depois de tantos anos a refinar o
seu estilo, conseguiu atingir em Moonrise Kingdom uma harmonia no cerne
emocional que o serve como uma luva e que, devido à habitual peculiaridade das
personagens, se revelava difícil de manter constante em filmes anteriores. Essa
história de amor juvenil em tempos de maior inocência é, para mim, do melhor
que foi feito até agora neste milénio, e só de me lembrar de Sam e Suzy a
dançar numa praia ao som de Le Temps De L’Amour, do primeiro álbum da Françoise
Hardy, já fico com palpitações, de tão maravilhosa que é essa cena.
Com um enredo bastante mais
intricado e vislumbres de contexto histórico, disfarçados por quantidades
enormes de lugares, apelidos, brasões e uniformes fictícios na Europa dos anos
30, The Grand Budapest Hotel mantém a fasquia elevada. Tanto a relação de pai e
filho entre o gerente do estabelecimento do título, o bonacheirão M. Gustave
(com Ralph Fiennes a espalhar charme e a confirmar o seu alcance infindável) e
o novo paquete, o obediente Zero (Tony Revolori, outro jovem a revelar talento
graças a Wes Anderson), como o namorico entre o rapaz e Agatha (Saoirse Ronan),
ajudante na pastelaria da moda, carregam carradas de compaixão e graça, a que
não consigo resistir.
Quando uma das amantes idosas de
M. Gustave morre e lhe deixa um quadro de valor incalculável, a ganância vai
persegui-lo e levá-lo a ser esmurrado, preso, fugitivo e quase abatido dentro
do seu próprio hotel, entre outras situações, algumas demasiado absurdas e
divertidas para serem arruinadas por qualquer descrição. As aparições de Bill
Murray, Jason Schwartzman, Edward Norton, Willem Dafoe ou Tilda Swinton são já
uma regra bem-vinda. A repetição obsessiva de certas cores, as composições
simétricas e as maquetes usadas como cenários são a cereja no topo do bolo. Um
bolo cuja receita está no ponto neste momento.
9/10
Apesar das boas críticas, os primeiros trabalhos de Wes Anderson não me convenceram, até estes dois belíssimos filmes.
ResponderEliminarMoonrise Kingdom e Grande Hotel Budapeste são fantásticos na parte técnica, tem histórias e personagens interessantes, além de serem extremamente originais.
Abraço
Concordo que estes dois últimos filmes são os melhores dele :) The Royal Tenenbaums e Fantastic Mr. Fox também são fabulosos, mas acredito que o Wes Anderson está no topo da sua forma de momento.
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