Aos 26 anos, Stanley Kubrick avançava para a sua segunda
longa-metragem, ainda sem metade que fosse da fama que viria a alcançar e dos
orçamentos de que viria a dispor. Como tal, Killer’s Kiss é uma obra menos
polida, onde faltam ainda muitas das características técnicas que viriam a demarcar
a filmografia deste realizador dos restantes colegas. Distancia-se já do
amadorismo de Fear And Desire (a estreia que o próprio Kubrick repudiava ao
ponto de ter tentado retirar de circulação) mas serve apenas como aperitivo
para o prato maior que é The Killing.
Neste film-noir sobre um pugilista que se envolve com a
vizinha dançarina, esta demasiado presa ao seu violento patrão, o que mais
impressiona é a estrutura. Com uma facilidade impressionante, o filme avança
por flashbacks dentro de um flashback mais abrangente sem nunca perder o fio à
meada. Logo na cena inicial, o pugilista Davy Gordon (Jamie Smith) espera uma
mulher na estação de comboios. Virá ter com ele? Recuamos para ver como tudo
começa, voltamos a recuar para saber mais sobre o passado dela, mas só no fim
poderemos ter a resposta à pergunta inicial.
Apesar de alguns momentos lentos e diálogos pouco convincentes,
há cenas cativantes, nomeadamente quando o filme se torna mais visual. Destaco
a perseguição em corrida por zonas industriais e tácitas de Nova Iorque, entre
prédios abandonados e telhados altaneiros, até uma fábrica de manequins, onde
os dois homens em disputa pela atenção de Gloria (Irene Kane) se digladiam até
à morte de um deles. Tudo isto fica a anos-luz de A Clockwork Orange e
restantes, mas se estivéssemos em 1955 poderíamos registar boas indicações,
elementos transgressivos e a vontade de mostrar algo diferente.
Kubrick fez treze filmes na sua carreira. No documentário A
Life In Pictures, realizado pelo irmão da sua última mulher, ouve-se alguém
dizer que ele não tinha prazer em ser tão lento a trabalhar, simplesmente
acontecia. Talvez por isso tenha concretizado alguns dos filmes mais rendilhados
e rigorosos de sempre. Quem quiser completar a carreira de um dos nova-iorquinos
mais famosos do cinema terá de passar por este Killer’s Kiss, de preferência
sem grandes expectativas, mas também não será nenhum sacrifício, pelo
contrário, é uma curiosidade com valor.
6/10
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