quinta-feira, 23 de abril de 2015

Stazione Termini (Vittorio De Sica, 1953)

Que os italianos são uns grandes artistas, ninguém questiona. Seja qual for a disciplina para que nos viramos, de certeza que houve algum transalpino que nela se notabilizou de alguma forma. O cinema é um exemplo (duh). A arquitectura é outro, atestado pelos prémios Pritzker atribuídos a Aldo Rossi e Renzo Piano, se falarmos apenas nos tempos modernos. O fascismo impulsionou escolas e padrões estéticos que acabariam por ser de pouca dura nos anos 40 e a reconstrução em massa das cidades no pós-guerra foi um período ímpar para novas experiências. Uma obra transversal a essas convulsões sociopolíticas foi a estação ferroviária Termini, que passou por demolições com Mussolini e renovações posteriormente.

Por causa dessas contrariedades e por ser a maior situada na capital Roma, é um espaço público com uma personalidade única, que De Sica explora neste filme, como se fosse a verdadeira personagem principal, dentro da qual Jennifer Jones, Montgomery Clift e Richard Beymer (pré-puberdade e pré-West Side Story) são meros transeuntes. Um caso entre uma americana casada e um playboy que se perde de amores instantaneamente por quem não devia, é o mote para este pequeno drama quase em tempo real. Mary espera o comboio que a vai levar para longe da tentação, mas Giovanni não quer abdicar da oportunidade única que pensa ter encontrado para ser feliz ao lado de uma mulher.

O tom contido, nocturno e intimista remete para Brief Encounter, bem como a história da aventura extra-conjugal, sendo igualmente recompensador a nível de interpretações e química. Aqui, o relógio está sempre a relembrar a brevidade da relação, mesmo pelo meio das indecisões de Mary e os contratempos inusitados que o romantismo e o desespero geram, incluindo bagagens perdidas, violência física e uma passagem pela esquadra da polícia, sabemos que o tempo é curto, incontornável, diáfano, ao contrário dos subterfúgios que um e outro inventam para ficarem juntos. Desculpem a linha de novela da TVI, mas perceber que temos de abrir mão do amor da nossa vida é das coisas mais tristes que há.

Por outro lado, que belo local para tal ponto final. A Termini de hoje retém o amplo hall de entrada, no entanto o aspecto imaculado de outrora já se foi. Claro que a fotografia a preto-e-branco irrepreensível, especialmente na captura de raios de luz artificial, que os postes e as colunas multiplicam por difusão, ajuda. A classe intemporal de Jones e Clift também. São duas masterclasses de expressão facial e corporal em situações de dúvida e atracção. A juntar aos diálogos de Truman Capote e ao guarda-roupa desenhado por Christian Dior, este é o filme mais modernista de um dos maiores artistas italianos, Vittorio De Sica. E o mais subestimado.

8/10

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